29/06/1965
Prefeito Antônio Martins Guerra, com o Deputado Pio Soares Canedo, representante do Deputado Sebastião Paes de Almeida no ato de desatar a fita inaugural.
Entre presente e passado reconhecer a produção sócio-histórica do universo no qual encontro-me inserido, que suscita experienciarmos a diversidade de possibilidades interpretativas.
segunda-feira, 7 de setembro de 2015
Festival de Inverno em Nova Era - 1975
Happening (01/07/1975) - O grupo de atores saiu do Bar Opção, percorreu a Valadares e subiu a Ladeira até a sede do Museu, que estava em estado precário. A intenção era chamar a atenção para o estado do casarão.
1ª voz:
Estamos indo pra nossa casa
lá comeremos pão quentinho.
Estamos indo pra nossa casa,
lá tomaremos nosso vinho.
2ª Voz:
Mas como pão e vinho
se nossa casa está ruindo?
Coro:
Mas como pão e vinho
se nossa casa está ruindo?
1ª Voz:
Se nossa casa está ruindo...
Oh, mas assim mesmo
cantaremos o nosso hino
comeremos e beberemos
à sombra das ruínas.
2ª Voz:
à sombra das ruínas...
Coro:
estamos indo pra nossa casa, etc.
quinta-feira, 9 de julho de 2015
quinta-feira, 28 de maio de 2015
Francisco Vieira Servas! Quem foi este homem?
Francisco Vieira Servas, artista português, entalhador
e escultor, nascido em 1720 na região do Minho, que, como muitos outros jovens
de seu tempo, se sentiu seduzido pelas narrativas que do além mar em sua terra
chegavam, onde eram contadas e recontadas, sobre o eldorado em terras do sertão
adentro no Brasil colônia. Chegar a essas terras passou a ser a sua meta, de
alguns de seus familiares e de muitos outros patrícios , principalmente das
regiões mais pobres, como o norte de Portugal, onde ele nasceu e lá vivia
juntamente com a sua família.
O sonhado território onde Servas e seus familiares
pudessem ser acolhidos, receber concessões de títulos de terra, melhores
condições de sobrevivência, mercado de trabalho promissor onde fosse possível
se afirmar como oficial entalhador e ser reconhecido como tal, colocar em
prática informações sobre novas formas decorativas que já se prenunciavam em Portugal, em especial as lições que
certamente recebera do mestre entalhador Francisco Vieira da Torre, seu
padrinho de Batismo. E assim nessa expectativa partiram para a travessia do
Atlântico, para viver uma grande e bem sucedida aventura nos sertões das
Gerais, tumultuado e promissor território, dinâmico canteiro de obras, efervescência social e cultural, circularidade
de informação. Mas não se sabe ainda em qual porto e a data da chegada de
Francisco Vieira Servas, juntamente com a sua comitiva ao Brasil Colônia.
É de relevante importância á Constatação documental
da presença de Vieira Servas em 1753, em Catas Altas, o documento que relevou o
artista e a sua presença no Brasil Colônia, especificamente na capitania de
Minas Gerais, onde tornou-se um profissional conceituado.
A sua articularidade nos centros mais dinâmicos, como
também nas periferias dessa Capitania é fato já devidamente comprovado,
principalmente regiões hoje denominadas Circuito do Ouro, onde deixou as suas
marcas, discípulos e um lastro de história, que paulatinamente vem sendo
desvendado.
A dinâmica de mercado de trabalho e diversidade de
informação reinante nos contextos incomuns da Capitânia, somados a sua carga de
conhecimento advinda de sua terra, obviamente determinaram a sedimentação
estética em sua obra surpreendentemente rococó, imprimindo nesse novo estilo a
sua identidade. Uma obra mantida numa linha coesa em seu conjunto, mas sem
perder o vigor, a constante e requintada mutação, sempre nos surpreendendo.
Artista que tornou-se respeitado em seu tempo, hoje
a sua arte encanta, e juntamente com arte de seus pares enobrece o patrimônio
cultural do nosso estado e do nosso país. Patrimônio de relevância para a
desejada consolidação do desenvolvimento de atividade turística na microrregião
do Vale do Rio Piracicaba.
Segundo o historiador português Eduardo Pires de
Oliveira, Francisco Vieira Servas foi um dos melhores exemplos de arte destes
dois mundos (Brasil/Portugal), que, apesar de separados por mais de 9.000
quilômetros de distancia, têm tantos ou mais pontos de união que de separação.
Elvécio Eustaquio da Silva
2015
Carnaval em Nova Era
Elvécio Eustáquio da Silva
Nas
primeiras décadas do século XX, na cidade de Nova Era, as agremiações
carnavalescas eram denominadas de rancho, dinamizavam a vida social de então,
animados cordões pelas ruas do distrito, e cada um realizava o seu baile, com
destaque para o Esperança e para o Operário,
motivados pela concorrência entre eles. Mas sobre estes ranchos pouco
sabemos.
A mais antiga informação escrita
encontrada sobre o carnaval em Nova Era, está num livro, Canfora Uma História,
escrito por Maria Canfora, comemorativo do Centenário da chegada da Família
Canfora ao Brasil – 1897 a 1997. Neste livro, a passagem da família da autora
por Nova Era se encontra registrada em detalhes, com destaque para os festejos
carnavalescos que foram realizados nesta cidade no ano de 1921, quando ainda
São José da Lagoa era distrito de Itabira. Nas páginas 38 a 40, emocionantes
narrativas de uma grandiosa festa momesca idealizada e realizada pelo pai da
autora, o italiano Alfredo Canfora, que soube interagir com a comunidade para a
sua concretização. Entre os 11 filhos do Casal Alfredo Canfora e Isaura Donati,
Maria Canfora, primogênita, portanto guardiã da memória da família.
Para o conserto de uma ponte de
madeira que se encontrava com partes arruinadas por falta de manutenção,
Alfredo Canfora chegou a São José da Lagoa em 1918, vindo de Belo Horizonte,
onde residia juntamente com seus familiares. Esta ponte, de nome Dona Amélia,
tinha o comprimento de 118 metros. Em 1920 Alfredo transfere a sua família para
São José da Lagoa e muitas amizades fizeram neste distrito. Em conversa com o
empresário local Oscar de Araújo, Alfredo revelou ter atuado na montagem de
carros alegóricos para o carnaval em Belo Horizonte. Descreve Maria Canfora:
“na mesma hora os olhos do Sr. Oscar brilharam de satisfação e abrindo os
braços falou com alegria: Alfredo, vamos mostrar a este povo o que é carnaval!”
Alfredo que nunca sabia dizer não, topou na hora e, neste mesmo dia, começaram
a fazer os planos para a grande festa que seria o Carnaval de 1921. A notícia
correu não só aqui, mas em toda a região gerando grande expectativa. Muitas
ações criativas e laboriosas foram desenvolvidas, algumas em absoluto segredo.
“O teatrinho da cidade foi todo
preparado com rigor para a realização dos bailes e matinês que foram animados
pela Corporação Musical Flor de São José, comandada pelo maestro Alvim
Vitorino”. É nesse teatro que aconteciam diversificadas atividades
comunitárias, como também era lá que as Companhias Teatrais e de outras
categorias artísticas que circulavam nesta região se apresentavam, entre
outras, a Companhia Miramar.
A grande atração deste carnaval foi
o desfile dos carros alegóricos tendo à frente “uma cavalaria formada por
jovens da cidade montados em cavalos ornamentados”, a seguir alas de jovens
fantasiados.
“O primeiro carro alegórico era
formado por dois Cisnes Brancos puxando uma pequena carruagem... o seguinte era
um enorme avestruz... em seguida, a grande sensação: um elefante, enorme,...
Fechando o desfile vinha a maior sensação da noite: O Dragão! O corpo do animal
era todo coberto por escamas... À meia noite, uma grande surpresa! Os fogos de
artifício! Foi um espetáculo inesquecível!...”
Através de um criativo e divertido
boletim-convite tomamos conhecimento do carnaval aqui realizado em 1942, no já
então emancipado distrito de São José da Lagoa, que passou a denominar-se
Presidente Vargas. Anunciando bailes à fantasia e premiações diversas. Segundo
o referido documento, essa festa aconteceu no cine local, mas que se tratava do
mesmo teatrinho onde foram realizados os grandes bailes em 1921, que passou a
funcionar também como cinema. Informou ainda que a renda seria em benefício da
construção do hospital da cidade e não cita nomes da comissão organizadora.
A revista Caminhos Gerais, edição
especial Nova Era 3 séculos de história (nº 29 -março de 2012) , traz em sua
página nº 55 uma foto do carnaval de 1950, “foliões comercialinos, Ercy,
Matilde, Lídia, Maria do Realino e Marieta juntamente com o folião Epídio,
exibindo as famosas lança-perfumes douradas”. Nas décadas de 40 a70 do século
passado, foi que se consolidou em Nova Era o carnaval de rua e de salão. Época
em que as Agremiações Sociais e Esportivas se encontravam no auge, a exemplo: o
Automóvel Clube, o Comercial Futebol Clube, Minas Esporte Clube .
As referidas instituições, em clima de rivalidade,
promoviam concursos internos elegendo as suas rainhas e princesas, que com
brilhantismo desfilavam pelas principais ruas da cidade em carros ricamente
decorados, acompanhados por alas e em corso de alegres foliões fantasiados e
cada agremiação com o seu conjunto musical. Os Blocos independentes e grupos
irreverentes davam graça ao carnaval.
As batalhas de serpentinas confetes
e lança-perfumes, e os foliões fantasiados pelas ruas e bares também foram uma
das marcas dos carnavais do período citado. As instituições em foco entraram em
processo de decadência, os blocos em grande número foram diminuindo, e o prazer
de fantasiar-se nos dias de carnaval foi se acabando e as marchinhas e o samba
foram desaparecendo da cena carnavalesca.
O carnaval em Nova Era, e certamente
em muitas outras cidades mineiras, no decorrer de décadas, passou por várias
fases, cada uma com as suas características. Na década de 70 a década de 90 do
século passado, por influência dos meios de comunicação de massa, as Escolas de
Samba, expressão cultural do Rio de Janeiro, proliferam-se por todo o interior
do nosso Estado. A cidade de Nova Era passou a ter, anualmente, com direito a
Rei Momo e Rainha, desfiles luxuosos de 4(quatro) escolas: Grêmio Recreativo
Escola de Samba Acadêmicos do Manjahy, ex Princesinha do Morro, Desce Ladeira,
Acadêmicos do Sagrada Família e Unidos do Ladilá, que ano a ano se degradiavam
numa disputa equivocada.
O carnaval local ainda era
enriquecido com bailes, matinês, blocos e grupos fantasiados, por último surgiu
a Bandinha dos Farrapos fazendo grande sucesso, manifestações amplamente
registrada pela mídia local e regional.
Em 1994 as 4 escolas fizeram os seus
últimos desfiles, deixando um lastro de conflito, e ainda, algumas levaram como
troféu dívidas acumuladas, e assim saíram de cena. Como aqui, as Escolas de
Samba foram desaparecendo nas pequenas cidades do nosso estado.
Lideranças desmotivadas não tiveram
projetos nem apoio para combater uma nova ameaça a nossa identidade, as
expressões carnavalescas baianas, conectadas à indústria fonográfica e redes de
tevê, com grande poder de influência e sedução, como os trios elétricos, bandas
de Axé, em maioria meramente comercial sem nenhuma qualidade, mera banalização
cultural, entre outras manifestações colonizadoras, provocando prejuízo
identitário, anulando matrizes culturais e assim inibindo uma busca
alternativa.
O Carnaval MPB na Rua Governador
Valadares, que aqui é um diferencial permanece. Permanecendo também a Bandinha
dos Farrapos e alguns remanescentes do Bloco Boca de Gole em trajes femininos.
Os grupos fantasiados desapareceram e os bailes de salão já não tem sentido.
Novos tempos!
Não sabemos qual será a nova
intervenção da mídia em nossa cultura para os próximos carnavais. Não podemos
ficar na contramão da história, somos nós, nova-erenses, através de uma
política cultural adequada, que temos de definir o rumo dos nossos próximos carnavais.
2013
domingo, 10 de maio de 2015
Fazenda da Vargem x Orçamento
Elvécio Eustáquio da Silva
Não resta dúvida de que o
Parque Municipal de Nova Era é um relevante patrimônio cultural e natural. Em
seu contexto paisagístico se destaca a Fazenda da Vargem, resultando numa
plataforma de valores históricos, arquitetônicos e ecológicos que dão suporte à
projeção de janelas de oportunidades a serem exploradas.
Essas oportunidades poderiam suscitar projetos
viabilizantes ao nosso desenvolvimento sociocultural, econômico e ambiental.
Caso a administração da nossa cidade compartilhe com esta visão, e tenha
vontade política para explorá-la, certamente garantirá o desenvolvimento nos
espaços do parque, criativa e necessária dinâmica. Caso contrário, o tão
celebrado monumento, Fazenda da Vargem, continuará sendo um mero cartão postal,
cenário para alguns dispendiosos eventos que, às vezes, ao passar de semanas,
caem no esquecimento. Enquanto isso os insetos xilófagos, que não pedem licença
para chegar nem precisam de alvará, lá se encontram em ostensiva labuta.
É possível mudar a situação do referido Parque
Municipal de Nova Era, adotando a inversão de prioridades de metas e
consequentemente orçamentárias, assegurando dotações necessárias a sua gestão,
conservação de um modo geral, requalificação de toda área, consolidação da
estrutura arquitetônica da fazenda, e dotá-la de equipamentos que deem suporte à
dinâmica desejada.
Ações priorizantes em sintonia com previsões
orçamentárias condizentes, codificadas para atender as múltiplas e necessárias
intervenções e a possíveis projetos a serem implantados e lá desenvolvidos.
Essas demandas, sendo concretizadas, levarão
os novaerenses a interagirem com pertencimento, apropriando-se do bem em foco,
realizações que certamente chamarão também a atenção da comunidade regional,
provocando um fluxo turístico, modalidade de desenvolvimento sempre aqui cantado
em verso e prosa, mas...
Se
hoje o sítio histórico e paisagístico em foco vem recebendo uma média de 350
pessoas ao mês, sem contar com uma divulgação adequada, nem mesmo uma simples
seta indicando o local, imaginem com uma boa divulgação e sinalização!
Se for
mantida a passividade orçamentária e a falta de iniciativa esta administração perde
a oportunidade de deixar uma marca expressiva, e o discurso de campanha,
cultura e turismo, do atual prefeito, cairá no vazio.
Sendo
o orçamento uma peça flexível, basta vontade política, uma dose de ousadia
administrativa para que, em nossa cidade, sonhos se transformem em realidade, e
certamente o governante detentor desta atitude será elevado ao pódio da memória
coletiva.
Mas
sem romper com as mesmices administrativas, as janelas de oportunidades que se encontram
disponíveis e que às vezes surgem vão acabar se fechando. Cuidado! O tempo não
espera por ninguém.
Nova Era, agosto de 2014.
domingo, 3 de maio de 2015
Efigeninha, relato de uma amizade
Entre as montanhas, o
recém emancipado distrito de São José da Lagoa (1938) passava por grandes
transformações: fabriquetas e estabelecimentos diversos se beneficiavam
excepcionalmente de dois ramais ferroviários.
Nesse cenário de
perspectiva progressista, precisamente no dia 15 de abril de 1939, nascia a 1ª
filha de Sebastião Bento Domingues, em segundas núpcias com Francisca Dias de
Almeida. No dia 5 de novembro do mesmo ano, na pia batismal da Matriz de São
José da Lagoa, a menina recebeu o nome de Maria Efigênia Dias Domingues. Seus
pais, Sebastião Padeiro e Dona Chiquinha, eram um casal que se destacava na
sociedade local e estava bem estabelecido na “praça”, dominando o mercado de
panificação com modernos maquinários, investimentos que anunciavam
prosperidade.
Nos primeiros decênios
do século XX, nações se digladiavam, nosso planeta vinha se transformando num
gigantesco campo de guerra. Eventos nefastos que expandiam com reflexos em
todos os continentes. E o que não se podia imaginar, que tais acontecimentos
afetariam a vida de pequenas cidades do interior do Brasil, acabou acontecendo,
trazendo angústia, pressão psicológica, medo, injustiça; abalando investimentos
com ações monopolizadoras e seletivas na distribuição de certas mercadorias e
insumos, como a farinha de trigo, o sal, o açúcar, a querosene, tudo em nome da
segurança nacional e da economia de guerra.
Nesse contexto, o
senhor Sebastião Padeiro não era mais o mesmo. Os negócios não iam bem, não
tinha mais a farinha de trigo suficiente para os pães e outros produtos de seu
empreendimento. E assim decidiu vender todo o maquinário da padaria. Abriu um
café que, por suas características, marcou época em nossa cidade. Na modéstia
foi levando a vida com serenidade e harmonia junto à prole do primeiro e do
segundo matrimônio. Nesse ambiente, Maria Efigênia Dias Domingues viveu sua
juventude.
Diante de uma folha em
branco, tenho-me perdido em divagações e reflexões sobre temporalidades e pergunto-me,
afinal, qual o porquê, após o falecimento de Maria Efigênia Dias Domingues, a
nossa popular Efigeninha, ocorrido no dia primeiro de janeiro de 2014, de ela
ter se tornado pessoa tão lembrada, discutida e homenageada em nossa comunidade
e na região?
Ela partiu, mas, de fato,
o que ela nos deixou, qual o seu legado?
Sobre ela muitas
perguntas e palavras já foram proclamadas e muitas folhas de papel já foram
escritas.
Mas, assumindo posição
no contexto deste discurso e na trama dos meus dizeres, busco uma síntese.
Sobre ela meu testemunho.
Projeto-me na
transversalidade do tempo e, neste avivar, situo-me a partir da década de 60 do
século XX, período dos meus primeiros contatos com Efigeninha, início de uma duradoura
amizade. Contrapondo a sua rígida formação religiosa um aflorar intelectual que
já se despontava, comedido, mas dando vista a uma possível abertura, o que de fato
se consolidou ao longo de sua vida, buscando sempre interagir com a diversidade,
tornando-se um ícone em nossa comunidade. Período em que ela já era ouvinte e
participante das utopias que já se cristalizavam em meu discurso, viveu em
sintonia com o contemporâneo, em meio a uma sociedade conservadora.
Em nossas causas
comunitárias, Efigeninha sempre se fazia presente, fisicamente ou tomando
partido, esclarecendo, justificando a importância das mesmas. Lutas de
resistência cultural, entre outras, a favor dos nossos bens culturais,
materiais e imateriais, a necessidade do nosso desenvolvimento cultural, a
criação do museu, a restauração e conservação da Matriz de São José da Lagoa;
pelo resgate da festa do nosso padroeiro São José da Lagoa, das celebrações do Reinado,
quando se ouviam seus inesquecíveis “vivas” a São José e a Nossa Senhora do Rosário.
Rotineiramente, com
grande disposição, Efigeninha vivia em trânsito, interagindo regionalmente,
indo e vindo, muitas vezes para outros estados para levar e buscar
conhecimento. Incrivelmente, sempre estava lá, em algum lugar, de repente ela
surgia aqui para cumprir os seus compromissos, às vezes com um certo atraso, mas
com muita alegria. Parecia que ela tinha a capacidade de estar em dois lugares
ao mesmo tempo.
Na década de 80 do
século XX, estávamos integrados às ações em favor da nossa bicentenária
Irmandade do Rosário. Lado a lado com a Rainha Conga D. Maria Francisca dos
Santos (já falecida) quando se deu a nossa introdução ao universo devocional,
místico e mítico da irmandade, às vezes hermético, contextos que vem
desaparecendo pela banalização das nossas tradições. Esta foi uma das causas
que Efigeninha abraçou por toda a sua vida. Em 1990, com muito garbo e
felicidade, ela e o então jovem entusiasta Eugênio Pereira Costa foram incorporados
às celebrações do Reinado de Nossa Senhora do Rosário como Reis Festeiros.
A trajetória comunitária
de Maria Efigênia Dias Domingues foi coroada pela intensidade participativa
avivada pelo dom de escutar o outro e compartilhar. Nas comunidades periféricas
e rurais, ela também esteve presente com a sua palavra amiga, incentivadora,
evangelizando, respeitando contextos identitários, congregando-se em seus
momentos de religiosidade tradicional, ao levantar de mastros com suas
bandeiras devocionais, nos fascínios de fogos de artifício, ao calor de
fogueiras, ao som das sanfonas e das batidas dos tambores.
Lembro-me de quando a
encíclica ‘’Gaudium et Spes’’ ( Parte 2, Cap. 2 ), do Concílio Vaticano 2°,
chamou a nossa atenção, pois algumas de suas recomendações vinham ao encontro
de nossas posições, atentava para o que ocorre ainda hoje. ‘’ Fazer para que os
intercâmbios culturais mais frequentes, que deveriam levar os diferentes grupos
a um diálogo verdadeiro e frutuoso, não perturbem a vida das comunidades, não
destruam sabedoria dos antepassados nem coloquem em perigo a índole própria de
cada povo’’. Infelizmente esta doutrina nem sempre é observada.
A minha convivência com
Efigeninha foi marcada por oportunos diálogos, exercícios de reflexão e
discernimento. Questões sobre política, religiões, religiosidade popular e
sobre o sagrado se tornaram um capítulo à parte em nossas conversas. Foi uma
constante troca liberadora de conhecimento, um levando ao outro recortes de
jornais, revistas, repassando informações e notícias advindas das mídias, de
cursos, congressos, etc.
Através de estudos e
dedicação, consequentemente Efigeninha foi se tornando senhora do universo no
qual se encontrava inserida, daí a maturidade, uma visão antropológica da
cultura que se deu em construção contínua, sem abalar as suas convicções
religiosas, suporte para o intercâmbio intercultural, daí a ampla visão
liberadora e a diplomacia diante de outras denominações religiosas e crenças.
Saliento sua grandeza em reconhecer religiões de matrizes africanas.
Neste breve testemunho
referente a Maria Efigênia Dias Domingues, esclareço ainda que ela não se
intimidava frente a provocações originadas de pessoas desinformadas, defendia veementemente
as suas convicções, ao contrário do que muitas pessoas pensam, ela não oferecia
a outra face para receber tapas, chegava aos limites do conflito, se fazia
respeitar. Mas muitas vezes diante da pequeneza humana, ela se elevava, se
deixava ser sucumbida pela sublimação, a misericórdia e ao perdão, simplesmente
se desvencilhava com altivez.
Mesmo que os impasses
da vida a levassem a lágrimas, que ela guardava para seus momentos de solidão, o
que é natural na vida de qualquer ser humano, a generosidade não lhe faltava.
Quando necessário
Efigeninha administrava divergências, ela sublimou fatos na trajetória da
própria família, historia pessoal, e assim alçou à história coletiva, tornou-se
protagonista de memórias.
Algumas pessoas já me
perguntaram, repito, qual o legado que ela nos deixou?
Para quem se dispõe a
refletir, sentir e se emocionar certamente encontrará esta resposta, pois como
diz o ditado popular “para quem sabe ler um pingo é letra’’. Portanto, basta reconhecê-la
como sempre ela reconhecia o outro, em constante acolhida, homens, mulheres, crianças,
jovens, idosos, negros, brancos, pobres e ricos, de qualquer raça, classe
social e gênero.
E nesse exercício de
memória, lembrar de seus conhecimentos de mestra, de sua alegria contagiante,
da sua altivez, humildade, generosidade e dos seus gestos de humanismo. E assim
cada um de nós recontará um capítulo da trajetória de Maria Efigênia Dias
Domingues na vida da nossa comunidade.
Às vezes, de madrugada,
abro a janela do meu quarto, fixo olhares e sentidos em direção à praça da
Matriz e, na plenitude do silêncio, ouço ecoar “vivas, vivas” a São José, como
se fosse ontem...
Elvécio Eustáquio da Silva
Tempo e Geografia
Entre presente e passado reconhecer a produção sócio-histórica do universo no qual encontro-me inserido, que suscita experienciarmos a diversidade de possibilidades interpretativas.
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