domingo, 27 de agosto de 2023

 

RÉPLICAS

 O artigo abaixo, Réplicas, foi escrito por mim em 2005, com o objetivo de difundir um eficiente recurso para a salvaguarda de bens culturais materiais móveis, principalmente os que ficam expostos ao relento, permanentemente ou temporariamente.

 

A utilização de réplicas para a salvaguarda de bens culturais significativos é comum em países europeus e em muitos outros.

aqui  Brasil, este procedimento é pouquíssimo difundido e, às vezes, provoca grande polêmica, como por exemplo o processo que se desencadeia para a transferência dos “Profetas de Aleijadinho” em Congonhas do Campo para um museu. Em seu Iugar seriam colocadas representações dos originais deste conjunto escultórico, que é de reconhecimento nacional internacional. Esta proposta    tem grande debate entre  intelectuais e especialistas.

Às vezes polêmica, mas eficaz, principalmente representar, em seus devidos lugares, os originais que se encontram expostos ao relento, protegendo-os das intempéries da natureza, dos efeitos da poluição e de atos de vandalismo, a utilização de réplicas constitui-se, também, em um recurso devidamente qualificado para compor coleções para mostras itinerantes, pedagógicas, educativas e promocionais.

Além disso, quando um bem cultural passa por um atentado, a existência de uma réplica muito contribuirá para a eficácia de sua restauração.

 

Entretanto, pessoas movidas pela boa intenção e pela fé não são capazes de perceber tal situação. De uma maneira respeitosa, precisam ser provocadas para se sensibilizarem com o fato.Através         de   palestras sobre educação patrimonial essas pessoas passariam a tomar consciência da importância e da necessidade de mudarem de atitude para contribuírem com a preservação de seus objetos devocionais. Assim, perceberiam que a melhor solução  seria a adoção de uma réplica para aquele objeto ou imagem de sua veneração.

Daí vem o impasse. A confecção de uma réplica é um trabalho de especializaçao notória, de alto  custo, sendo também de alto custo para as comunidades a restauração de peças já danificadas. Como resolver esta situação?

Por outro Iado, não é tradição das administrações públicas e das paróquias contemplar projetos desta natureza.

A presença de um bem cultural, quer seja ele  profano ou sagrado, patrimônio de um município, em stands de eventos promocionais de suma importância, porém, muitas vezes determinados bens identitários só poderão estar presentes se for através de suas réplicas, as quais podem ser transportadas sem restrições para qualquer Iugar do país, além de poder ser expostas em múltiplos espaços da própria cidade, popularizando-as e agregando valor à identidade desta comuna. Além disso, é também possível   produzir réplicas   em   tamanhos   reduzidos, que podem ser   adotadas como troféu da cidade, brinde oficial, ou simplesmente como souvenir para sua comercialização.

 

Os objetos sagrados que se encontram expostos à veneração pública muitas vezes são arrebatadores de multidões, tornando-se receptíveis a atentados. A utilização de uma réplica para representá- lo certamente garantirá a sua permanência.

As nossas imagens procissionais constituem- se num caso bem específico, em que a utilização de réplicas resolveria o problema. Trata-se de imagens em  sua maioria bicentenárias, esculpidas em madeira.

Além do assédio dos fiéis, do manuseio  indevido por mãos que não foram sensibilizadas para esta atividade, ficam expostas ao sol, ao sereno da madrugada e, às vezes, às águas das chuvas, situações essas não recomendáveis à sua boa conservação. Soma-se a isso os solavancos a que são submetidas durante seu translado em cortejo, e a maneira quase sempre inadequada com que são fixadas nos andores.

Tudo isso resulta em perda de policromia, abalos em suas estruturas, além da perda das partes mais frágeis e vulneráveis, como os dedos e os lances esvoaçantes do panejamento.

Diante do exposto, qualquer leigo percebe que, nestes casos, alguma providência deve ser tomada, sendo a adoção de uma réplica a solução mais adequada.

 

Através da mídia, só constatei até hoje a existência de réplicas das imagens de Nossa Senhora  Aparecida, em Aparecida do Norte, de Nossa Senhora de Nazaré, no Pará, e dos profetas em Congonhas do   Campo. Já através de informação oral, certifiquei-me da existência da réplica de Nossa Senhora do Bom Sucesso, em Caeté.

A nossa cidade, Nova Era, também está  incluída neste rol de cidades que tomaram esta iniciativa. Trata-se de uma réplica imagem bicentenária de São José da Lagoa, nosso padroeiro, que é transportada em procissão anualmente, como também quando presente em outras celebrações religiosas.

Este foi um sonho concretizado graças ao empenho, a colaboração e o apoio de membros da  comunidade nova-erense.

terça-feira, 17 de maio de 2022

Uma jornada devocional de Santa Bárbara a Mesquita e a Belo Oriente

 


 

No início do século XX, José Garcia da Silva e sua esposa Isolina da Silva, na época moradores na cidade de Mesquita, por uma graça alcançada, prometeram doar à comunidade do “Galo”, posteriormente Belo Oriente, uma imagem de Nossa Senhora da Piedade.

A promessa foi cumprida, com uma imagem adquirida no Rio de Janeiro, despachada via Estrada de Ferro Central do Brasil, até a cidade de Santa Bárbara, onde, em 1912, foi inaugurada uma estação. O fato ocorreu entre 1912 e 1916, mas ainda não temos conhecimento sobre o translado da imagem até “Piedade do Galo”. É possível que tenha chegado a Mesquita através de São Gonçalo do Rio Abaixo. Se fosse hoje, a imagem teria chegado embalada a seu destino sem nenhuma comoção popular. Mas no início do século XX, o translado foi um grande acontecimento, a imagem conduzida por uma comitiva, em padiola (andor), às vezes em carro-de-boi, passando por vários obstáculos, a imagem sendo recebida festivamente por onde passava, nas paradas de descanso ou pernoite do cortejo, talvez com direito a queima de fogos e banda de música. E assim foi passando por cidades, arraiais, fazendas, proporcionando em cada parada momentos de fé e emoção. É impossível que não tenham sido realizados registros sobre esse acontecimento em paróquias, em reportagens de pequenos jornais regionais, e mesmo registros fotográficos.

A tradição oral nos legou que a última parada desse translado devocional se deu na cidade de Mesquita, onde a imagem e comitiva pernoitaram e de lá, festivamente em cortejo, conduziram a imagem ao seu destino, a comunidade de Piedade do Galo: a última etapa do cumprimento de uma promessa.

Segundo a senhora Maria Celeste de Abreu (residente em Belo Oriente) “essa imagem desapareceu no período da demolição da antiga igreja local, na década de 1960”. Caso tenham alguma informação sobre essa história, compartilhem.

Elvécio Eustáquio da Silva, sobrinho-neto de José Garcia da Silva, neto de Joaquim Simões da Silva e Josefina Lacerda de Oliveira.

Para saber mais: Gustavo Werneck, Jornal Estado de Minas, 20/01/2018. Maria Celeste de Abreu, Sertão Bravo do Rio Doce, pp 216 a 217. Belo Oriente. 2000.

segunda-feira, 14 de março de 2022

REFLEXÕES SOBRE A LEI FEDERAL N O 11.645

 

REFLEXÕES SOBRE A LEI FEDERAL N O 11.645

Elvécio Eustáquio da Silva

"O Brasil é um país mestiço. O futuro do mundo é a mestiçagem, todo mundo sabe disso, não é? É preciso, então, assumir essa mestiçagem em seu sentido mais amplo e complexo".

Laura de Mello e Souza

Entrevista — História como desenho

Revista de História da Biblioteca Nacional Rio de Janeiro — RJ — Ano 04, n O 46, julho de 2009 pags. 50 a 55.

A Lei Federal n o 1 1 .645, de 10 de março de 2008, altera a lei n o 9.394, de 20 de dezembro de 1996, modificada pela lei n o 10.639, de 09 de janeiro de 2003, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática "Historia e Cultura Afro-Brasileira e Indígena' nos estabelecimentos de ensino fundamental e ensino médio, públicos e privados.

Esta lei tem a função estratégica para a formação e auto-estima do povo brasileiro, afro-descendentes em sua maioria, recompensando erros históricos) com o reconhecimento dos mesmos e dos seus antepassados, no processo civilizatório da vida brasileira, na condição de sujeitos na construção da sociedade.

O êxito na aplicação desta lei não só dependerá da capacitação do magistério para absorvê-la, mas muito mais do que isso, dependerá principalmente da humildade de cada um de se curvar diante de uma nova realidade e contextos que ela propõe desencadear. Ela vem revestida de uma certa superioridade que está acima de muita coisa que achamos que sabemos, das nossas religiões, dos nossos preconceitos. Ela desconstrói teses e reconstrói valores. Estamos sendo conduzidos ao encontro da essência do saber construído e reconstruído, que vai nos guiar a uma pedagogia e a uma didática libertadora, libertando a nós mesmos, para libertar uns aos outros.

Este é o momento de cada um assumir o seu papel na regência da cadeia de ações que se desencadeará na reconstrução sociocultural do nosso país. Levará o professor a um recomeço, ele estará lidando com o novo, o surpreendente dentro do processo histórico educacional, Ele buscará erudição nas raízes da Comunidade para a formação de um suporte didático e pedagógico, para levar às salas de aula a matéria proposta.

Trata-se de um grande desafio, mas não um bicho papão, e ao mesmo tempo um privilégio para nós que nos encontramos envolvidos neste projeto de capacitação. Ele oportunizará vivenciarmos a simbiose de saberes com a comunidade.

Na produção acadêmica e empírica, que se encontra disponível em vários suportes tradicionais e de alta tecnologia, buscaremos informações complementares para a possível contextualização do fato local, regional, à luz da ciência e da historiografia pertinentes.

Só terá sentido a aplicação desta matéria na sala de aula se ela promover conteúdos identitários, subsidiados pela memória local, e assim revelar com grande expectativa comunitária, histórias de pertencimento, e quem sabe, de encantamento.

Levar junto às comunidades açÕes interativas para a identificação de lastro de interesses, quer sejam eles materiais, imateriais — profanos e sagrados.

Especialistas em educação e comunidade descobrindo e redescobrindo no seu território marcas da cultura africana, estratificadas em bens materiais e imateriais — saberes, fazeres e devoções.

A existência de quilombos, já reconhecidos ou não, reverterá em privilégio para este projeto, tanto para a localidade, tanto para os professores, que teìão disponível um acervo de evidências desta estratificação latente no coletivó de vivência secular, permanência e pertencimento.

Nem todas as nossas comunidades têm o privilégio de possuir um quilombo, ao vivo e a cores. As vezes os teve no passado, onde a memória oral dessas agremiações permanecem, mas às vezes só permaneceram a nomenclatura "quilombo" no espaço geográfico onde eles existiram. Locais de importância relevante, pelo potencial de memória não revelada que neles se encerraram, propício a früiçäo cultural e espiritual, por excelência, um local para a reflexão e meditação. Mas é possível reconstituir o dia-a-dia dessas comunidades quilombolas em seu tempo através de projetos arqueológicos.

Na Capitania de Minas Gerais, os africanos e conseqüentemente os afrodescendentes se espelhavam no devocionismo da hagiografia Cristã, assumindo devoções que eram também comuns na África Portuguesa, entre outras, Santa Efigênia, São Benedito e principalmente Nossa Senhora do Rosário. Devoções que, desde os primórdios da Capitania, foram estabelecidas publicamente através de irmandades, que edificaram nesta terra inúmeras igrejas e capelas, como também cemitérios. Algumas atravessaram séculos e permanecem, muitas desapareceram como também ressurgiram, resultando um potencial de memória de grande significado, marcante no processo civilizatório em Minas Gerais. Memória disponibilizada em nossa região para ser absorvida e apropriada por nós.

Reconhecemos que, além das duas potenciais fontes que foram expostas quilombos e irmandades, muitas outras, certamente, ainda serão reveladas, e poderão vir a somar, para que sejam arquitetadas propostas sólidas em função do cumprimento efetivo das exigências da lei em pauta.

Partiremos na prática para o reconhecimento, descobertas, valorização e revalorização. Revitalização de valores socioculturais através de sua apropriação e inserção em conteúdos disciplinares, e devolvê-los para a comunidade, numa interação de auto-estima e pertencimento, em busca de caminhos possíveis para o desenvolvimento humano e econômico.

Nova Era, 14 de julho de 2009.

domingo, 27 de fevereiro de 2022

 

Escola de Samba Desce Ladeira

Elvécio Eustáquio da Silva

O Grêmio Recreativo, Cultural e Escola de Samba Desce Ladeira (Nova Era) foi criado em 15/12/1975, por iniciativa da professora Ilma Brand. E no ano seguinte, a agremiação carnavalesca ficou popularmente conhecida por Desce Ladeira. Foi a primeira escola de samba criada em nossa cidade. A letra de seu primeiro samba-enredo foi escrita pela professora Hercília de Araújo. O segundo, 1977,“Coisas da Rosária”, por solicitação de Ilma Brand, é de minha autoria, com música de Antônio Walter, músico marianense muito ligado a nossa cidade. Em 6 de setembro de 1980, este samba enredo fez parte do repertório do “LP” “Nova Era Canta”, gravado pela Bemol, idealizado e coordenado por Maria José Fonseca (Tatá), na voz de Efigênio (Macalé).

A professora Ilma Brand nasceu em 22 de março de 1937 e faleceu em 10 de junho de 2004.

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2022

Carnaval de 1994

Matéria da Revista Ponto Final, de João Monlevade, ano 1, nº 2, março de 1994. Página 14.